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Um, Ninguém e Cem Mil - Luigi Pirandello


"E como se de súbito estas palavras se tivessem tornado, sei lá, de pedra, não pude ouvir o que Firbo me gritou entre dentes antes de se ir embora, furioso. Sei que sorria quando Quantorzo, que aparecera logo após a discussão, me arrastou consigo para a sala da direcção. Sorria para demonstrar que a violência já não era necessária e que tudo acabara, embora sentisse bem que nesse momento, enquanto sorria, teria podido matar alguém, de tal forma a severidade excitada de Quantorzo me irritava. Na sala da direcção pus-me a olhar em volta, espantado por o estranho aturdimento em que repentinamente caíra não me impedir de perceber clara e precisamente as coisas até quase me sentir tentado a troçar delas, acabando prepositadamente, no meio de feroz admoestação que Quantorzo me dava, por fazer algumas perguntas de uma curiosidade infantil acerca deste ou daquele objecto da sala. E entretanto, sei lá, quase automaticamente, pensava que o Stefano Firbo, quando era pequeno, lhe tinham nascido borbulhas nas costas e que, embora não se lhe visse a corcunda, toda a sua caixa torácica era de corcunda; sim, sobre aquelas finas e compridas patas de pássaro havia um corcunda elegante; sim, sim, um falso corcunda elegante; bem sucedido."


Acabei de ler este livro que foi Nobel da Literatura em 1934. Demontra que a lucidez também traz a loucura e impossibilidade de nos darmos aos outros como nos conhecemos sem sermos sempre um pouco deles. Tal como os livros que apenas são dos escritores quando o escrevem, depois fica ao critério da livre interpretação de quem o lê, também nós somos o que pensamos ser até nos darmos a conhecer. Depois o Outro vai dar a sua interpretação do que somos e seremos para ele o que entender que somos mediante o que apresentamos... estranha conversa para um livro que impele à reflexão e à loucura de nunca ser... mesmo que tentemos sê-lo contruído, será sempre a contrução que cada um irá interpretar. Então, seremos um para nós, ninguém porque jamais nos defineremos de forma una e cem mil consoante a interpretação de cada qual.

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Eu Quero Viver - Nina Lugovskaia

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